Como uma das precursoras das análises sobre cidades médias no Brasil, esta publicação mantém atual o convite para pesquisas sobre o tema, apresentando um quadro de referência sobre cidades médias da época do estudo. Nesse sentido, Thompson Almeida Andrade, com contribuições de Celsius Antonio Lodder, expõe o relatório de pesquisa relativo aos estudos sobre o sistema urbano, enfocando as cidades médias brasileiras. Apresentam as cidades médias daquele período como centros que congregavam parcela significativa da população e das atividades produtivas do país. Para os autores, as cidades médias teriam potencialidades passíveis de serem exploradas por políticas nacionais de desenvolvimento urbano, pois poderiam ser focos alternativos de crescimento econômico que, estimulados e manipulados, constituiriam opções às tendências concentradoras das metrópoles.
O professor Thompson Almeida Andrade é doutor em Economia, participou de vários trabalhos junto ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), fundação pública federal vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Destes trabalhos resultaram diversas publicações, muitas delas classificadas como textos para discussão, disponíveis no site do IPEA, dentre estes vários relativos ao tema cidades médias, os quais compuseram ou subsidiaram a obra Cidades Médias Brasileiras (2001), organizada por Thompson em conjunto com Rodrigo Valente Serra.
Entre os objetivos dos estudos contidos nesta obra, constam aqueles relacionados à compreensão da “estrutura” urbana brasileira, tanto no que se refere aos processos relacionados ao sistema de cidades, quanto às características das cidades médias neste sistema. Objetivos característicos dos estudos que começam suprir a escassez de bibliografia sobre o tema naquele momento.
O livro contém seis capítulos, nos quais é destacado que as cidades de porte intermediário brasileiras, por volta de 1970, apresentaram “um desempenho que ressaltou as suas características, seja em termos de altas taxas de crescimento demográfico, do seu alto poder de absorção de mão de obra, seja em termos da sua potencialidade como elemento de ocupação territorial e de difusão do desenvolvimento para outras cidades e áreas sob sua influência” (p. 9).
O primeiro capítulo contém a introdução, que destaca a estrutura do livro dividida em duas partes: a primeira, composta pelo capítulo II, e na qual se buscou analisar o sistema urbano brasileiro; a segunda, composta pelos capítulos III, IV e V, na qual se examinou as estruturas econômicas e sociais das cidades médias brasileiras. Sintetizando as características destas duas partes o capítulo VI mostra os resultados gerais e apresenta algumas propostas para o desenvolvimento das cidades pesquisadas.
Denominado “O processo de crescimento urbano no Brasil”, o segundo capítulo contém várias questões, que serviram de base para o estudo das cidades médias brasileiras, que comparecem nos capítulos subsequentes. Deste modo, apresenta a análise, além dos aspectos econômicos, dos aspectos políticos, ideológicos e institucionais que influenciaram nas transformações do sistema de cidades no contexto urbano brasileiro. Trata-se, inicialmente, de um esforço feito para analisar historicamente a formação do sistema de cidades e o processo de urbanização brasileiro, este especificamente estudado entre 1940 e 1970. Ao caracterizar esse processo, os autores destacam como, no período entre 1950 e 1970, por exemplo, observou-se uma alteração significativa na dinâmica urbana, visto que “os centros de tamanho intermediário cresceram a taxas superiores à média nacional, e mesmo a das metrópoles, sendo que o número de centros aumentou quatro vezes” (p. 30), observações que foram contextualizadas considerando as especificidades regionais presentes no caso brasileiro.
No terceiro capítulo, efetua-se “Uma visão agregada das cidades médias”, mostrando diversas características das mesmas, tais como: a) localização relativa, segundo o estado; b) especificidades demográficas, considerando as variações regionais; c) aspectos econômicos, com destaque para os valores da População Economicamente Ativa (PEA), da produtividade e das atividades terciárias; d) especificidades sociais, ligadas a mão de obra e acesso aos serviços básicos.
O tema do quarto capítulo é “Pobreza urbana nos centros de porte médio”. Nesta subdivisão do livro, os autores analisam quais as causas da pobreza urbana e a posição hierárquica destes centros de porte médio na escala de pobreza urbana. O que os autores consideram por pobreza urbana abrange a oferta de bens e serviços urbanos básicos e os baixos níveis de rendimento médio mensal, no caso da pobreza familiar. Para os estudos, foi utilizado um índice de pobreza urbana criado por Tolosa (1977), a partir do qual se buscou classificar os níveis de bem estar dos habitantes das cidades médias. Os indicadores considerados foram: habitação, saúde, educação, emprego e renda e consumo de bens duráveis a partir dos censos demográfico e predial de 1970. Considerando a complexidade e as variações presentes no contexto brasileiro, no qual as cidades pesquisadas estavam envolvidas, foram destacados os limites e as potencialidades dos modelos utilizados. Ao apresentar os resultados em termos de pobreza urbana, os autores mostram a existência de dois grupos de cidades médias, o primeiro composto por cidades do nordeste e o segundo por cidades no sul/sudeste enfatizando que por trás desta diferenciação encontra-se o desnível econômico e social existente entre estas regiões brasileiras.
Para analisar a relação entre “Crescimento econômico urbano e as cidades médias”, no quinto capítulo, os autores utilizam teorias que permitem compreender aspectos do crescimento urbano, quais sejam a Teoria do Lugar Central e a Teoria da Base Urbana, a primeira ao permitir relacionar o crescimento da cidade com o mercado local, a segunda ao relacionar tal crescimento com a capacidade de exportação da cidade. Considerando que ambas as abordagens possuem vantagens e defeitos, no que diz respeito à capacidade de explicar o crescimento econômico de uma cidade os autores as utilizam em conjunto. A partir de critérios desenvolvidos com base no estabelecimento de dimensões, selecionadas pelo uso da análise fatorial junto ao conjunto de diversas variáveis, os autores elaboraram uma classificação em que é possível observar o potencial de crescimento econômico de cidades médias brasileiras, permitindo correlacionar alguns desempenhos das cidades médias e a capacidade de análise que os procedimentos adotados permitiram. Considerando os resultados obtidos, os autores fazem algumas inferências sobre as possíveis formas de cruzamento das informações, como, por exemplo, considerar o crescimento econômico ocorrido em cidades que fazem parte de grupos de cidades relativamente mais pobres.
Denominado “Resumo das Conclusões”, o capítulo seis apresenta a discussão de alguns resultados. Considerando que a urbanização no Brasil atingia todas as regiões naquela época, os autores destacam que, embora tenha acarretado a elevação da população dos grandes centros urbanos, o processo de urbanização proporcionou um aumento do número e da população das cidades médias nas décadas de 1960 e 1970. Outro resultado destaca que, devido algumas diferenças regionais entre as cidades médias brasileiras, existe certa dicotomia de centros urbanos de porte intermediário, com as regiões Sul e Sudeste se destacando como aquelas nas quais os centros urbanos de porte intermediário apresentam melhores condições econômicas. Já no que se refere à pobreza urbana em cidades médias, os autores concluíram que as principais determinantes da pobreza urbana nestas cidades, até então, eram os componentes das estruturas ocupacional e produtiva. Desse modo, ao aprofundar as análises sobre a diferenciação de pobreza urbana entre cidades médias do Nordeste e do Sul/Sudeste, a partir de indicadores como nível educacional, dimensão industrial e estágio de desenvolvimento econômico, os autores propuseram medidas como investimento com conotação social e reforço da estrutura produtiva.
Finalizando, mostram que as projeções sobre crescimento econômico apontaram que no Nordeste as cidades médias possuíam menores e no Sul/Sudeste maiores potencialidades de crescimento, embora outras informações lancem questionamentos sobre estes resultados, como no caso do indicador sobre arrecadação de tributos federais nos municípios considerados, que mostra o reverso da potencialidade de crescimento acima apresentada e permite questionar ainda mais a ocorrência de maior pobreza urbana sob esse patamar de arrecadação.
A bibliografia utilizada nesta obra é composta por quarenta e quatro títulos, predominando os textos brasileiros, com destaque para aproximadamente vinte por cento do total no idioma inglês. Em geral, ambos relacionados aos aspectos econômicos e informações quantitativas relativas aos processos que podem influenciar na transformação do sistema de cidades ou da realidade das cidades médias brasileiras, como nos casos do crescimento populacional, das indústrias, do emprego, das migrações e da pobreza urbana.
É evidente que o que os autores estão denominando cidades médias refere-se ao que atualmente vários estudos estão elencando como cidades de porte médio, pois em suas análises priorizam os aspectos quantitativos. Note-se que, embora os autores tenham certo cuidado quando destacam que ”para uso deste estudo foi considerado como o estrato em que devem ser encontradas as cidades médias aquele em que se encontravam os centros e aglomerações urbanos que possuíam em 1970 uma população urbana entre 50 mil e 250 mil habitantes” (p. 35), o uso do termo cidade média não é conceitualmente abordado quando especificam a seguinte nota: “estas cidades podem ser igualmente chamadas de centros intermediários, cidades médias, de porte médio, centros urbanos médios […]” (p. 36), o que evidencia parte de seu caráter principiante quanto aos aspectos teóricos conceituais, não devido ao uso da terminologia em si, mas no que se refere a ausência de esforço de definição e de reconhecimento dos aspectos contraditórios que envolvem a dinâmica urbana neste caso, tal qual o do conjunto dos principais papéis desempenhados por cidades potencialmente pertencentes ao âmbito investigado, enquanto cidades médias.
Notas Bibliográficas
ANDRADE, Thompson A., LODDER, Celsius A. Sistema Urbano e Cidades Médias no Brasil. Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1979.